segunda-feira, setembro 24, 2012

EDUARDO COLLEN LEITE - O BACURI

Como bom cidadão do regime militar, em 1967 foi incorporado ao exército, servindo na 7ª Companhia de Guarda, e, no Hospital do Exército, no bairro do Cambuci, região central de São Paulo. Na época em que frequentou o exército, a grande ala da esquerda dos oficiais de menores patentes, tradicionalmente históricas no Brasil, tinha sido completamente expurgada.

Eduardo Leite passou a integrar a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), uma organização política armada de extrema esquerda. Mostrou-se um militante arrojado e destemido, que se iria notabilizar pela eficiência em executar as mais difíceis tarefas das guerrilhas urbanas.

Para não ser identificado pelos serviços repressivos do regime, Eduardo Leite passou a usar o codinome de Bacuri, apagando de vez o antigo técnico de telefonia, tornando-se um ávido militante da esquerda opositora à ditadura. O codinome virou alcunha, grudou-se de forma indelével à pele e à alma de Eduardo Leite, que se despiu totalmente do pacato cidadão para dar passagem ao violento guerrilheiro. Bacuri, descrito pelos companheiros de luta como simples, afável e bem-humorado, tornar-se-ia para o regime militar um terrorista sanguinolento e temível. Bacuri passou a ser uma lenda na história das guerrilhas da esquerda. A alcunha se lhe perseguiria até a sua morte.
O ano de 1969 despontou como uma ressaca do AI-5. Seria um dos anos mais violentos tanto para a ditadura, quanto para as organizações de esquerda. Em abril, Bacuri deixou a VPR para fundar a Resistência Democrática (REDE). Destacou-se rapidamente nas empreitadas da guerrilha urbana. Praticou dezenas de assaltos a bancos, supermercados e carros fortes, sem nunca se deixar apanhar. Sua reputação de perigoso subversivo logo se espalhou. Ainda naquele fatídico 1969, seu rosto aparecia estampado, ao lado de Carlos Marighella, nos cartazes de “Procurados” espalhados pelo país. Bacuri tornara-se uma lenda, um nome que incomodava os agentes da repressão.

As operações de assaltos a bancos e supermercados envolviam grandes riscos, podendo vitimar tanto os assaltados quanto os assaltantes. Os assaltos tinham como finalidade levantar dinheiro para as operações de luta armada, além de poder manter a sobrevivência dos que viviam na clandestinidade, impedidos de trabalhar e ter o seu próprio sustento. Muitas vezes, dentro dos aparelhos, a fome falou mais alto do que a ideologia. Bacuri tornou-se o militante mais eficiente para executar essas operações, o que lhe acarretou uma vida de extrema violência e de mortes nas costas, aumentando-lhe a fama de “terrorista” perigoso.
Entre os mortos nas operações de assalto, foram imputados direta ou indiretamente a Bacuri, as mortes de: Abelardo Rosa Lima, soldado da policia militar de São Paulo, metralhado numa tentativa de assalto ao Mercado Peg-Pag, em 6 de outubro de 1969. Além de Bacuri, participaram do assalto Walter Olivieri, Devanir José de Carvalho, Ismael Andrade dos Santos e Mocide Bucherone. A operação foi realizada em conjunto, pela REDE e pelo Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT).

Orlando Girolo, bancário de uma agência do Bradesco em São Paulo, morto numa operação executada por Bacuri e Devanir José de Carvalho, representando a REDE e o MRT, respectivamente. João Batista de Souza, guarda de segurança da Companhia de Cigarros Souza Cruz, no Cambuci, em São Paulo. Bacuri foi identificado como o autor do assassínio, aumentando-lhe substancialmente a fama de guerrilheiro. A operação foi novamente executada pela REDE e pelo MRT, reunindo outros militantes das duas organizações.

A competência de Bacuri nas operações de guerrilha, fez dele o militante ideal para novos seqüestros. Ao lado da mulher Denise Crispim, participou ativamente no seqüestro do cônsul do Japão em São Paulo, Nobuo Okushi. VPR, REDE e MRT, realizaram a operação, em 11 de março de 1970. As negociações com o governo resultaram na libertação de cinco prisioneiros políticos.

No dia 11 de junho de 1970, em plena Copa Mundial de Futebol, realizada no México, mais uma vez Bacuri fazia parte de outro seqüestro, o do embaixador alemão Ehrenfried Von Holleben. Durante a operação de seqüestro, Bacuri disparou três tiros contra o agente da polícia federal Irlando de Souza Régis, matando-o com um tiro na cabeça. A morte do agente, que fazia a segurança do embaixador, gerou um recrudescimento dos órgãos de repressão do governo, que se lançaram implacáveis na perseguição aos guerrilheiros, em especial, na captura de Bacuri. 

Alfredo Sirkis, um dos seqüestradores, relataria mais tarde, que Bacuri aparecera sem capuz diante do embaixador, o que lhe causou constrangimento e irritação, pedindo que ninguém se apresentasse a ele com o rosto descoberto. A operação rendeu a libertação de quarenta presos, entre eles Fernando Gabeira e Vera Sílvia Magalhães, envolvidos no seqüestro de Charles Elbrick.

No dia 15 de julho de 1970, a militante Ana Bursztyn aguardava a hora para dirigir-se ao ponto combinado com os companheiros. Como estava adiantada, passou pela loja de departamentos do Mappin, pegando alguns cosméticos. Seu nervosismo atraiu as desconfianças de um fiscal; quando se dirigia ao caixa para pagar, o fiscal pediu para que abrisse a bolsa. Levada à sala do chefe de segurança, Ana Bursztyn apavorou-se quando pediram para revistá-la, sabia que na bolsa estava uma arma, o suficiente para incriminá-la. 

Ao ser descoberta, tentou fugir, puxou da arma, uma taurus 32, atingindo o chefe de segurança na perna. Ferimento suficiente para causar uma hemorragia e matá-lo. Ana Bursztyn foi presa, no dia seguinte os jornais anunciavam que se havia prendido a guerrilheira ladra. Submetida a intensas e ininterruptas torturas durante oito dias, Ana Bursztyn deixou escapar o endereço do aparelho de Bacuri.
Como conseqüência, Denise, grávida de poucos meses, foi presa. 

Silenciosamente, à distância, Bacuri, ao lado dos companheiros Carlos Eugênio Paz e Ana Maria Nacinovic, assistiu à prisão da mulher. Mais tarde, tentando evitar que Denise fosse torturada, telefonou para o comandante do II Exército, identificando-se como Bacuri, guerrilheiro da ALN. Avisou ao militar que Denise tinha sido presa pelo DOI-CODI, e que se alguma coisa acontecesse a ela e à criança, iria matar o general-comandante do II Exército. 

Os militares só deram importância à ameaça, quando Carlos Eugênio voltou a telefonar, dando detalhes da rotina do general, ameaçando ceifar-lhe a vida. Acossados, os militares negociaram com Bacuri a libertação da mulher e do filho. Denise Crispim foi libertada mediante acordo para que se preservasse a vida do general. Foi a última vitória do guerrilheiro Bacuri sobre a ditadura. A partir de então, seria procurado e, se apanhado, sua vida não teria mais valor.
                                                      Elio Gaspari, no livro “As Ilusões Armadas”, relata que Bacuri viveu o último dia da sua vida no forte dos Andradas, no Guarujá. Chegara ao local dentro de um saco de lona, sendo encarcerado em uma solitária erguida na praia do Bueno. Dali teria sido levado para um túnel do depósito de munições. No dia 8 de dezembro, segundo narrativa do soldado Rinaldo Campos de Carvalho, uma veraneio parou em frente à entrada do depósito, de onde saltaram um major e dois tenentes. Foram ao local onde Bacuri estava trancado, anunciando que iriam levá-lo para o hospital militar. 

Segundo o soldado, que ajudava o prisioneiro a encostar-se na pia para que se pudesse lavar, o major ordenou que saísse. Ele só ouviu uma pancada, que ambiguamente não sabe tratar-se de um tiro ou de uma cabeça a bater contra a parede. Testemunhou que, logo a seguir, o corpo foi retirado do banheiro no mesmo saco de lona em que fora para ali trazido. Acabaram-se os 109 dias da sua agonia.
Oficialmente, as autoridades anunciaram para a imprensa que Carlos Collen Leite, o Bacuri, morrera em tiroteio em Boracéia, estrada que liga Bertioga a São Sebastião, litoral paulista, após oferecer selvagem resistência.


Fonte: JEOCAZ LEE-MEDDI


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