A corrupção no Brasil existe mesmo antes de se tornar império
e posteriormente nossa atual república. Para ilustrar a afirmação, um pequeno trecho de
Isabel Lustosa, historiadora da Casa de Rui Barbosa (RJ) e autora de
"Insultos Impressos" (Companhia das Letras), entre outros livros. Nosso
exemplo era o tesoureiro-mor de D. João VI e chamava-se Francisco Bento Maria
Targini.
“No "Correio", Hipólito criticaria o fato de o
conde dos Arcos, principal ministro do regente, D. Pedro, ter dado por justas e
liquidadas as contas do tesoureiro-mor e concedido passaporte para aquele se
pôr ao fresco (no contexto, livre).
Segundo Oliveira Lima, o inquérito contra Targini, conduzido
pelo conde dos Arcos, "estabeleceu a integridade do funcionário, a quem
foi concedida uma pensão".
Talvez Lima não conhecesse um manuscrito de 17 páginas
datado de 1807 e intitulado "Ode ao Conde dos Arcos", que consta do
acervo da Biblioteca Nacional e assinado por Francisco Bento Maria Targini.
Segundo Antonio Paim, Targini foi o responsável pela
tradução para o português do tratado publicado por Charles Villers, em 1801,
"A Filosofia de Kant ou Princípios Fundamentais da Filosofia
Transcendental".
Uma das coisas que Oliveira Lima alega em defesa de Targini
é o fato de ser homem culto que traduziu o "Ensaio sobre o Homem", de
Pope, e "O Paraíso Perdido", de Milton. Esta última foi publicada em
Paris, em 1823, com reflexões e notas do tradutor, numa edição muito luxuosa.
De fato, Targini, quando chegou a Lisboa, em 1821, foi
impedido de desembarcar, retirando-se para Paris. Ali viveu até morrer em 1827,
certamente com tempo e dinheiro para gastar em suas obras de erudição.
Creio que, apesar da defesa de Oliveira Lima, vale o refrão
espanhol que Hipólito da Costa usou para ilustrar a situação de Targini:
"Quem cabras não tem e cabritos vende, é porque de algum lugar lhe
vêm".
Seu enriquecimento no cargo de tesoureiro-mor de um reino
tão empobrecido devia ser indício suficiente para condená-lo.
Sua vasta erudição não é atenuante, e sim, agravante.
Os pequenos corruptos, incultos e quase analfabetos, como o
barbeiro Plácido e a marquesa de Santos, roubavam no varejo, da despensa do rei
e do bolsinho do imperador.
Targini roubava à grande, ostentando seus ganhos e
correspondendo fielmente a uma outra versão da quadrinha popular e que
terminava dizendo”: "Quem mais rouba e não esconde/ passa de barão a
visconde".
Todos posteriores a Targini, não importa os cargos ocupados devem ter
seus “deslises”.
Mais a este, na história contemporânea do Brasil, só consigo
comparar tamanho cinismo aos governadores do estado de São Paulo Adhemar Pereira
de Barros, Paulo Salim Maluf e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. ("Eu
já fui julgado. A eleição da Dilma foi um julgamento extraordinário. Para um presidente com oito anos de mandato, sair com 87% de
aprovação é um grande juízo")